EDITORIAL

Representações Nacionais

Representatividade, Representantes e Representados

Por Paula Melâneo e Inês Moreira
Julho 2016

Uma nova etapa marca este novo J—A, a vontade da Ordem dos Arquitectos em torná-lo numa plataforma online, mais participativa e com conteúdos de acesso aberto a todos. Esta equipa de redacção aceitou o desafio, respondendo através de um projecto editorial que tem um olhar alargado sobre questões da actualidade, procurando a pluralidade e diversidade dos intervenientes e a inclusão de opiniões diferentes (e divergentes) sobre assuntos da arquitectura. Esta nova plataforma mantém a publicação de um jornal de periodicidade trimestral e integra ainda um ciclo de debates, que serão livres e posteriormente disponibilizados em vídeo na plataforma. Complementa-se ainda de um fórum que convida os interessados a participar seja com a publicação de crónicas regulares; na partilha de informações sobre edifícios esquecidos e, ainda, através de uma galeria de registos, com conteúdos (imagens, desenhos ou vídeos) partilhados em redes sociais (usando hashtag #jornalarquitectos).

 

Aproveitando o Verão, e um pouco mais de tempo para a leitura, lançamos este primeiro número on-line, o #253, que apresenta assim a nova plataforma. Com atenção à actualidade, centramo-nos no tema das representações oficiais portuguesas em grandes exposições internacionais de Arquitectura. O primeiro semestre de 2016 foi marcado pela apresentação simultânea de três exposições internacionais dedicadas à Arquitectura Portuguesa, que visitámos: o pavilhão português na 15ª Exposição Internacional de Arquitectura da Bienal de Veneza, a participação portuguesa na XXI Exposição Internacional da Trienal de Milão e a exposição Os Universalistas: 50 anos de arquitectura portuguesa, promovida pela Fundação Calouste Gulbenkian de Paris. O momento de grande visibilidade fora de portas abriu-nos inúmeras questões que propomos analisar e debater, desde logo, perguntar: que princípios dão origem à selecção do comissariado ante uma representação oficial de arquitectura; quais os critérios de curadoria dos eventos, e seus conceitos, bem como da selecção dos arquitectos/ateliers e das obras representadas? Não deveriam estas exposições ser mais ambiciosas do que  simples itinerâncias de exposições existentes, como tem acontecido? Sendo as bienais plataformas internacionais mais especulativas do que a prática/encomenda corrente de atelier, podem os arquitectos convidados discutir os temas e projectos da sua participação, e apresentar projectos inéditos ou conteúdos criados em resposta aos eventos?

O que representam estas selecções, o que mostram e, afinal, quem representam? Conhecidos os processos de escolha e as modalidades de representação, pela voz dos seus principais decisores, importa reflectir criticamente sobre qual a diversidade e abrangência, a representatividade, que estas selecções oferecem da arquitectura criada em Portugal (ou da arquitectura portuguesa).

 

O J—A #253 estrutura-se em três linhas que levantam questões gerais sobre as representações oficiais, concretizando primeiramente na Bienal de Veneza e por fim nas restantes exposições e eventos internacionais. A primeira linha é dedicada às questões de fundo que são transversais a todas as representações oficiais, criando elementos de sistematização e de arquivo das diversas representações através da recolha de dados e de fotografias sobre as principais representações nos últimos anos nas bienais de Veneza e de São Paulo, e na Trienal de Milão. Segue-se uma reflexão crítica sobre a representatividade e utilidade das mesmas (Altares). A propósito de como “seleccionar os seleccionadores”, recolhemos testemunhos de alguns dos principais decisores políticos de instituições responsáveis, no presente e no passado, pela selecção de comissários e curadores, em alguns casos dos próprios autores, quando nominalmente convidados. Ainda nesta linha, ouvimos sobre a existência, ou não, de pavilhões nacionais (Pavilhão!?) e sobre as políticas de representação de estados-nação nas maiores bienais do mundo pois, se a Bienal de São Paulo aboliu as representações de Estado e hoje apresenta autores individuais, Veneza vive ainda o paradigma da afirmação nacional através de “selecções nacionais” de arte e de arquitectura de cada país representado.

 

A segunda linha que atravessa o J—A apresenta uma visão aprofundada sobre a grande representação internacional de arquitectura que é, ainda, a Bienal de Veneza. Inclui-se uma crítica sobre os contornos da participação de 2016, mostrando o projecto da Reestruturação do Campo di Marte, na Giudecca, de Álvaro Siza, simultaneamente um dos projectos em exibição e o local de acolhimento do pavilhão português deste ano. A par da reflexão crítica, apresenta-se um vídeo inédito da inauguração do pavilhão, com entrevistas a individualidades e ao público presente na “tavolata” inagural. Em complemento, publicamos uma reportagem sobre o Seminário dedicado aos 12 anos de representações de arquitectura portuguesa em Veneza, que ocorreu em Abril, e que se ilustra com vídeos das comunicações dos vários arquitectos-curadores.

 

E finalmente uma visão panorâmica mais alargada faz-se olhando criticamente os conteúdos e os contornos organizacionais da exposição oficial portuguesa na Trienal de Milão, Objects after Objects e, também, analisando os conteúdos e a narrativa curatorial da exposição Les Universalistes, presente na Cité de L’Architecture et du Patrimoine de Paris. Ouvimos, em entrevista, as opiniões de dois agentes envolvidos no pensamento sobre a arquitectura em Portugal: Alexandre Alves Costa, sobre a possibilidade de existência de uma identidade na arquitectura portuguesa e sua condição no presente, e Manuel Graça Dias, que reflecte sobre quais os representantes, os elementos aglutinadores e as identidades da arquitectura em Portugal. Por fim, visitam-se alguns dos novos lastros destas representações, a vida dos vídeos e conteúdos audiovisuais que têm sido produzidos ao longo dos últimos 10 anos.

 

No final desta longa pesquisa e contacto com exposições, discursos e arquivos, ficam questões em aberto relativas à própria natureza e propósito das repesentações internacionais: qual a finalidade com que são concebidas as representações oficiais? Há uma estratégia sobre o que mostrar lá fora? A sua política não tem sido constante, oscilando entre tentativas de constituição de conhecimento através da curadoria, sem que a promoção de debate teórico e cultural com agentes e audiências de diversos países se tenha ainda consolidado, mas, sobretudo, prevalecendo um intuito de “internacionalização” no sentido da angariação de trabalho e serviço fora de Portugal, numa lógica de exportação de serviços. Entre estes pólos existe um largo espectro de possibilidades, mas é também facto que as representações nacionais têm sido fundamentalmente momentos de consagração de carreiras e percursos de arquitectos já  estabelecidos, divergindo da tendência internacional de usar os grandes eventos para divulgação de novos valores, temas e autores ainda em ascensão.

 

O J—A convida agora à participação dos leitores através da apresentação de propostas de crónicas sobre arquitectura e sociedade, bem como de documentação relativa a edifícios “esquecidos”, sejam abandonados ou transformados. A participação é feita através do envio dessas propostas para ja@ordemdosarquitectos.pt. ◊

 

 

NOTA: A redacção do Jornal Arquitectos está em “desacordo ortográfico”.

 

 
Representações Oficiais Portuguesas