ENTREVISTA

Arquitectura 3.0

Uma conversa sobre o programa de networking internacional da Fundação de Serralves

Por Carlos Machado e Moura
Arquitecto e doutorando (FAUP)

Durante o ano de 2017, Serralves levou a cabo um projecto dedicado à promoção e à internacionalização da arquitectura do Norte de Portugal. Entre as várias componentes conta-se um programa de vocação empresarial, composto por acções de networking em várias cidades estrangeiras, com a participação de 34 ateliers. Conversámos com a comissária do projecto, Ana Maio, e com os comissários do programa de networking internacional, Teresa Novais e Luís Tavares Pereira, para conhecer os detalhes da experiência e as dificuldades e desafios à internacionalização dos arquitectos portugueses.

 


 

Workshop em Estocolmo © Teresa Novais
Workshop em Estocolmo © Teresa Novais

Para começar a conversa e antes de falarmos especificamente no programa de networking internacional, em que consiste o projecto Arquitectura/3.0 que Serralves desenvolveu ao longo de 2017?

Ana Maio (AM): O projecto chama-se inicialmente Arquitectura/3.0 — Promoção e internacionalização da arquitectura portuguesa da Região Norte e surge como uma candidatura feita por Serralves a um quadro comunitário específico para a promoção internacional de serviços.

 

O projecto será divulgado numa plataforma digital e tem vários pontos. O primeiro é uma caracterização do sector da arquitectura na região Norte. Esta será construída a partir de um inquérito online que, com base nas respostas dos diversos ateliers, gera automaticamente gráficos que permitem uma análise muito imediata do sector: dimensão e alcance internacional dos ateliers, natureza dos projectos realizados, formas de angariação de trabalho, etc. Para além desta leitura, os ateliers poderão divulgar o seu próprio trabalho nesta plataforma.

Um segundo ponto reside no tratamento e digitalização de 40 projectos do arquitecto Siza que foram doados à Fundação de Serralves e cuja divulgação será feita conjuntamente com os parceiros deste projecto, o Canadian Centre for Architecture (CCA) e a Fundação Calouste Gulbenkian.

 

Um terceiro ponto consiste num conjunto de acções de networking internacional com vários ateliers de arquitectura, uma iniciativa comissariada pelos arquitectos Teresa Novais e Luís Tavares Pereira. Trata-se de um desafio difícil, já que a candidatura estava orientada para a participação em feiras; portanto, não ajustada ao perfil dos arquitectos.

 

Por fim, um quarto ponto, trata-se de um workshop internacional durante o mês de Janeiro para a troca de informações e partilha de experiências sobre várias formas de internacionalização da arquitectura e um conjunto de conferências, que conta com a participação de vários convidados envolvidos na promoção internacional da arquitectura portuguesa com diferentes abordagens. Estes momentos serão uma forma de capacitar e munir os arquitectos e empresas de arquitectura com ferramentas para divulgar os seus serviços no estrangeiro e entrar em mercados internacionais.

 

Associadas a estas conferências estão também uma exposição com uma selecção de trabalhos apresentados ao concurso para o pavilhão expositivo de Serralves e uma série de visitas técnicas, envolvendo embaixadas e investidores estrangeiros em Portugal, como forma de divulgar a arquitectura e de captar a atenção de potenciais interessados em contratar os serviços de arquitectos portugueses.

É este o mote de todo este projecto. Trata-se de divulgar os serviços de arquitectura e os arquitectos da região Norte numa óptica mais empresarial e através do contacto directo com potenciais parceiros e clientes. O âmbito cultural está também presente, como é lógico, e o projecto é muito alargado, incluindo diferentes componentes, algumas delas muito específicas e muito pouco exploradas. Por exemplo, o trabalho de networking comissariado pela Teresa e pelo Luís constitui, a meu ver, uma vertente muito pouco explorada, a de haver uma instituição que agrupe uma série de arquitectos e que promova uma campanha de divulgação dos serviços de arquitectura a nível internacional.

 

Com efeito, essa é uma tarefa que tende a ser feita individualmente e serão até poucos os ateliers com uma estratégia comercial muito estruturada. Mas esta iniciativa de Serralves seguiu exemplos de outros projectos semelhantes?

AM: Quando entrei no processo, a candidatura já tinha sido submetida e aprovada. Portanto não sei se foi feita alguma pesquisa sobre casos semelhantes para a sua elaboração. Excluindo o trabalho de algumas ordens a nível internacional, que têm gabinetes de apoio para a internacionalização, não conheço nenhuma acção tão completa e específica no domínio da arquitectura. Existem gabinetes de várias instituições, como a AEP ou a AICEP, que oferecem meios e apoio para entrar em outros mercados internacionais, na América ou na Ásia. Porém são apoios que funcionam de forma ampla, não são programas vocacionados para a arquitectura.

 

 

Stand Fundação de Serralves em Colónia © Luís Tavares Pereira
Stand Fundação de Serralves em Colónia © Luís Tavares Pereira

Como é que foi montada esta iniciativa, feita a selecção dos ateliers e organizadas as acções?

Teresa Novais (TN): O projecto tinha inicialmente um formato mais apropriado à venda de produtos do que de serviços, e consistia na internacionalização de 32 empresas através de presenças e networking em quatro feiras. De forma que, quando fomos convidados, sugerimos uma alteração do formato porque pareceu-nos claro que não iria resultar. Apesar de existirem imensas feiras de imobiliário, não são adequadas ao perfil e à escala das empresas de arquitectura portuguesas. Estas feiras estão vocacionadas para grandes empresas de projectos, que são raras no Norte do país. 

Portanto, começámos desde logo a procurar alternativas. Acresce que as grandes feiras de imobiliário são na sua maioria muito dispendiosas. O custo das inscrições, o aluguer do espaço a construção e concepção do pavilhão, e todas as despesas necessárias para a presença dos ateliers esgotavam numa única acção, um terço do orçamento do projecto. Acabámos por participar só em duas feiras — a Exponatec Cologne, feira internacional do sector da Museologia, Restauro e Património, e no Symposium da feira imobiliária Barcelona Meeting Point.

Como só tivemos oportunidade de começar a trabalhar no final de Maio, o nosso principal obstáculo foi o tempo muito reduzido que tivemos para organizar as acções e fazer a pré-selecção das equipas. Com base numa pesquisa que fizemos, e conjuntamente com o nosso conhecimento dos ateliers desta região, conseguimos reunir uma lista de mais de 60 arquitectos do Norte do país, a quem dirigimos um convite para apresentarem um portfólio muito sintético. Procurámos, desde logo, contrariar a ideia que a internacionalização se faz com ateliers comerciais, e com grande experiência, que é uma espécie de pescadinha de rabo na boca, apostando antes na ideia de diversidade de oferta, de escala, de geração, de focar na valorização e exposição internacional algumas pesquisas individuais que podem suscitar o interesse de investidores precisamente pela diferença e, claro, pela excelência e qualidade do trabalho.

Cada portfólio estava limitado a um máximo de 20 páginas e quatro projectos, de forma a simplificar o processo de avaliação. No verso deveria constar um statement sobre o atelier, muito orientado numa lógica de promoção de serviços.

Ao mesmo tempo que fazíamos esta selecção e os contactos com os escritórios, começámos a preparar as acções.

Quanto à composição do júri, para além do mínimo de 50% de arquitectos exigido pela Ordem dos Arquitectos, escolhemos envolver pessoas que não fossem do Norte do país. Para além de garantir alguma distância, essa opção era sobretudo uma oportunidade de divulgar os ateliers pré-selecionados. Assim sugerimos à Fundação de Serralves convidar uma pessoa relevante na encomenda pública e outra na encomenda privada, ambas do Sul do país. Foi convidado o arquitecto Rui Serrano, que pertenceu ao executivo da Câmara Municipal de Abrantes, município que promoveu projectos como o Mercado de Abrantes (da autoria de ARX) ou o Museu Ibérico de Arqueologia e Arte (de João Luís Carrilho da Graça) —, sabíamos que desempenharia bem o papel, e certamente conhece poucos arquitectos da região Norte. Da encomenda privada foi convidado o engenheiro Paulo Dias, que trabalhou muitos anos no ramo do imobiliário na Polónia para a Mota-Engil. Juntaram-se a estes nomes os arquitectos Nuno Grande e Ana Maio e, ainda, o Dr Rui Costa, gestor dos projectos especiais de Serralves. Asseguraram-se assim os 50% de arquitectos e nós ficámos apenas a secretariar, uma vez que já tínhamos feito a pré-selecção. O processo ficou concluído a 31 de Julho e, com a lista fechada dos ateliers, pudemos avançar com programação e execução das acções.

 

Qual foi a receptividade dos ateliers convidados? A adesão ao projecto foi imediata ou, pelo contrário, mostraram reticências quanto a esta abordagem?

TN: Sim, houve alguma reticência. Os arquitectos, por um lado, querem participar mas, por outro, têm muitas dúvidas quanto à eficácia deste tipo de acções. Houve gabinetes que não concorreram por falta de tempo ou interesse; outros participaram mas com muitas reservas, espelhando a pouca internacionalização dos serviços de arquitectura da região Norte do país.

Nós também temos dúvidas quanto à eficácia do projecto mas, se o aceitámos fazer, é porque achamos que as oportunidades surgem sempre de novos contactos, mesmo que só se concretizem daqui a cinco ou 10 anos. Depende em parte da vontade de cada um potenciar os contactos e os desenvolver. Nós tentamos somente abrir portas.

O Luís sugeriu, e bem, que organizássemos as sessões sempre com dois momentos. Um mais de acordo com o programa, composto por sessões de networking com potenciais clientes locais; outro orientado para a constituição de parcerias com o objectivo de aproveitar o momento actual em que temos muito investimento estrangeiro em Portugal. Há uma mudança de paradigma. Há cinco anos atrás, em que não havia trabalho cá, era necessário sair. Hoje coloca-se uma nova questão. Há trabalho mas, muitas vezes, os promotores são estrangeiros e trazem já os seus arquitectos, pelo que é preciso chegar a estes potenciais investidores antes. Mas também será sempre necessário fazer parcerias com arquitectos locais, para realizar obras fora de Portugal.

 

Luís Tavares Pereira (LTP): Ainda ontem vinha uma entrevista com o Rui Marques no Público em que ele dizia: “Só vão sobreviver aqueles que souberem colaborar”1. Como toda a gente quer vender, há que vender e que comprar, gerar ocasiões de troca e mostrar disponibilidade de oportunidades que tanto podem surgir aqui como no estrangeiro. Portanto, se vamos para fora reunir com potenciais investidores e com colegas, para montar parcerias, temos de mostrar aquilo que, da nossa parte, temos para oferecer. Pode não haver interesse imediato, mas os contactos ficam feitos e a porta fica aberta para ocasiões futuras. Mesmo assim, prevalece a desconfiança dos arquitectos: “ah, isto não dá nada...”.

 

TN: É demonstrador da falta de formação empresarial da grande parte dos arquitectos, muito diferente do tecido empresarial do Norte, que sempre se mostrou dinâmico, sempre se “desenrascou” mesmo sem falar línguas e sem apoios estatais, conseguindo exportar com sucesso os mais variados produtos. Nos serviços de arquitectura ainda mal começámos.

 

LTP: Por outro lado, uma iniciativa top-down como esta — em que o projecto dá os meios para os arquitectos irem lá para fora e organiza estes encontros sem que eles o peçam —, também nos levanta algumas dúvidas… A ocasião não é plenamente aproveitada porque a desconfiança permanece. Ainda assim, há consequências positivas. Desde logo, porque esta experiência implicou alguns ajustes. Por exemplo, vários colegas nossos não tinham o site actualizado ou em inglês... e esta foi a oportunidade que os obrigou a criar a resposta.

 

TN: Apesar de muitos não valorizarem o trabalho que se viram obrigados a fazer, como o simples facto de traduzir os textos. Mas este tipo de coisas, já são acções que vão abrir outras portas. Eu e o Luís sempre nos mantivemos muito positivos, porque acreditamos que as ocasiões poderão acontecer.

 

LTP: Outro aspecto que é interessante é o facto de os arquitectos participarem em grupo e, assim, terem conhecimento das estratégias de comunicação de cada um: desde aqueles que levam panfletos, um pequeno livro ou até um postal. E vão trocando ideias e constatando o que funciona melhor.

Até nós, fomos ajustando o discurso à medida que o projecto foi evoluindo e passámos a reunir informação sobre o imobiliário em Portugal para a passar a investidores estrangeiros. E mesmo Serralves, na Exponatec em Colónia, uma feira de museus, aproveitou para apresentar o próprio trabalho da Fundação associado à promoção dos cinco ateliers que fizeram os pavilhões temporários. Portanto essa exposição motivou um interesse simultâneo no trabalho dos arquitectos, no Porto e em Serralves. E surgiram até oportunidades de itinerância da exposição...

 

E as outras acções, como surgiram?

TN: Nova Iorque foi a primeira, logo um desafio. Ainda não tínhamos a selecção dos ateliers finalizada e fomos reunir com a Associação Empresarial de Portugal (AEP) que estava a organizar uma exposição multissectorial —comida, armamento, laticínios, rochas ornamentais, materiais de construção — a Nova Iorque no início de Setembro. Disponibilizaram-se de imediato para nos incluir na missão sem qualquer custo. De seguida, o Luís conseguiu montar uma reunião no The American Institute of Architects (AIA) com arquitectos locais.

 

LTP: Para além disso, a AEP tinha contratado os serviços de uma consultora em Nova Iorque para atrair investidores e clientes para a mostra de materiais. Deste modo Serralves contratou também os serviços da mesma consultora para identificar investidores e potenciais clientes para as reuniões business to business (b2b) com os nossos arquitectos. Discutiram-se uma série de possibilidades de colaboração e agora estamos a manter o contacto com os americanos e a estudar a possibilidade de fazer coisas em conjunto. Com o apoio da consultora, procurámos explorar o potencial do Porto para o investimento americano e eventualmente faremos um workshop cá para continuar com a lógica: nós oferecemos, depois pedimos para a troca.

Em Estocolmo o nosso parceiro foi a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), que organizou a sessão b2b e fez os contactos com os investidores. Nós organizamos o encontro com os arquitetos suecos a partir de contactos que tínhamos na KTH. A AICEP acompanhou-nos sempre e, como tem um financiamento para trazer prescritores de materiais a Portugal, pode financiar a vinda de arquitectos cá, e assim as conversas que iniciámos lá poderão ter uma continuidade. Trata-se de potenciar as oportunidades a partir dos recursos existentes.

 

AM: Realmente nestas acções de networking está concentrada a essência do projecto global. O facto de os arquitectos irem em grupo permite fazer uma promoção da arquitectura portuguesa extremamente directa. E a receptividade é muito boa, mas deveria ser um trabalho de continuidade, que se repetisse várias vezes para conseguir de facto implementar uma posição mais alargada dos arquitectos portugueses a nível internacional. Em Barcelona foi diferente, mas em Nova Iorque ficaram surpreendidos com a qualidade dos arquitectos portugueses. Se fosse um projecto continuado, certamente teria um forte impacto.

É certo que alguns dos arquitectos que participaram nestas acções já integraram comitivas da Presidência da República ou do Ministério dos Negócios Estrangeiros para a divulgação da arquitectura portuguesa. Mas esta é uma acção completamente diferente, muito mais específica e não é simplesmente empresarial. Inclui uma componente pedagógica e cultural acerca da arquitectura portuguesa e a do Norte em particular, que é muito conhecida lá fora, e essa postura é diferente daquela que os interlocutores estariam à espera e foi muito bem recebida.

 

E em Barcelona?

TN: Tivemos de ir à procura de parceiros locais e tivemos a hipótese de fazer uma parceria com a revista Vida Imobiliária porque ia haver uma enorme feira de imobiliário em Barcelona, intitulada Barcelona Meeting Point (BMP). A proposta que nos fizeram era muito interessante: em vez de ficar lá com um pequeno stand, propuseram-nos um espaço no BMP Investors Cluster, um espaço onde podíamos receber pessoas e fazer os contactos. Fomos para lá com os nossos arquitectos e simultaneamente o nosso parceiro organizou um debate sobre as vantagens de investir no Porto, com a presença do Dr Ricardo Valente, Vereador da Economia da Câmara Municipal do Porto, João Leite e Castro, Partner da Predibisa e o João Pedro Serôdio (um dos arquitectos envolvidos na missão), moderado por Antonio Gil Machado Director da Iberian Property. Durante o fim-de-semana, o BMP estava aberto ao público em geral, mas os três dias que lhe antecediam eram reservado a investidores de toda a Espanha e não só, através do Symposium BMP com diversas sessões incluindo  refeições de networking, desde o pequeno-almoço até ao jantar. Os nossos arquitectos tinham acesso a todo o Symposium, apesar de não terem aproveitado tanto como poderiam por desconforto com este tipo de acções. Curiosamente era o grupo dos arquitectos com mais experiência pelo que este formato seria até uma oportunidade. Após o debate foram organizadas uma manhã e uma tarde de reuniões parcelares entre arquitectos catalães e os arquitectos portugueses que decorreram no BMP Investors Cluster.

 

Qual foi a estratégia que guiou a escolha dos destinos?

LTP: A escolha adveio muito das oportunidades que fomos tendo, mas primeiro procurámos identificar os mercados onde o imobiliário estava a crescer: a Suécia, a Polónia e a Europa de Leste, o Sri Lanka, etc. Depois surgiu a oportunidade de Nova Iorque, que também está a registar um crescimento imobiliário brutal. Entretanto, a feira Exponatec Cologne já tinha sido identificada como estratégica por Serralves e, no próprio concurso, os cinco ateliers já estavam identificados para participar nessa acção. Depois tivemos o apoio do Ministério da Economia e reunimos com um assessor do Ministro para discutir oportunidades e surgiram vários contactos e a ligação às embaixadas e à AICEP, que permitiu organizar as acções de Estocolmo e mais tarde Paris. Por fim, começámos a trabalhar a ideia de Barcelona, por sugestão da Vida Imobiliária. Paris tem uma grande diáspora e os franceses são os maiores investidores em Portugal. Veio assim completar o leque, a quinta acção em Janeiro, até porque as quatro inicialmente previstas no projecto para os 32 arquitectos implicavam um número demasiado elevado de participantes em cada uma.

 

Portanto, os contactos foram surgindo através de associações muito espontâneas...

TN: Sim, e a acção na Exponatec também correu muito bem por causa disso. Contactámos a Universidade de Colónia [TH Köln] que, por coincidência, tinha prevista para este ano uma visita com alunos a Portugal para visitar o Estádio de Braga. Enviámos-lhes os links e os portfólios dos cinco ateliers que fizeram os pavilhões de Serralves e, durante a passagem cá, aproveitaram para visitar cada um dos escritórios e convidaram-nos a ir à Universidade dar uma pequena conferência e fazer revisões aos trabalhos dos alunos. Para estes arquitectos, que são muito jovens, é uma oportunidade fantástica.

 

LTP: E agora também se perspectivam outras possibilidades já que, por exemplo, todos os anos a Universidade em Colónia dedica o ano a um país convidado e organiza umas conferências. Para o ano que vem, possivelmente pensarão em Portugal. É o velho ditado “longe da vista, longe do coração” ao contrário. E todo o projecto funcionou assim, aproveitando as oportunidades por proximidade e eficácia.

 

E entre arquitectos, encontraram grandes afinidades e semelhanças no discurso?

TN: Grandes afinidades, sim. E havia pessoas que não se conheciam, apesar de o Porto, antes, a região Norte ser um meio pequeno. Foi interessante ver o encontro entre diferentes gerações. Por outro lado, também esteve muito presente a marca que a crise deixou nos escritórios mais experientes, algo muito traumatizante que os arquitectos exteriorizam porque foi a sua experiência dos últimos quase 10 anos e que os marcou muito. O próprio discurso começa sempre por explicar aquilo que cada um estava a fazer, a conseguir conquistar e que perdeu. Não há arquitecto com mais de 45 anos que não comece a explicar o seu trabalho a falar da crise e como isso mudou necessariamente a sua prática. Já os arquitectos mais jovens  explicam o seu trabalho e as parcerias que fazem de forma mais pragmática. Tudo isto é muito interessante e merece reflexão. A nós competia-nos fazer a formalidade das apresentações, ouvir e permanecer invisíveis.

 

E discutiram possibilidades de associação?

LTP: Essa é uma questão central e crítica, sobre a qual vale a pena reflectir. E discutimos sempre entre nós as questões de escala e as possibilidade de associação. Há uma tendência de concentração em todas as actividades comerciais — nos bancos, na indústria automóvel, etc. —, a própria União Europeia aponta para isso e nós vamos começar a ver isto também na arquitectura. Este programa é um ensaio que, a meu ver, demonstra que a associação é perfeitamente possível. E não detectei nenhuma incompatibilidade entre todos estes arquitectos, nem sequer gerações distintas. Pelo contrário, há afinidades evidentes.

 

Falta é um interlocutor, alguém que motive as pessoas a associarem-se, já que de mote próprio dificilmente acontecerá. Da mesma forma que é preciso trabalhar para cultivar as pistas que vão surgindo, é também necessário que os arquitectos se juntem e percebam de que forma é que podem trabalhar de forma operativa. Um programa deste género poderia servir de motor — dando um passo em frente — para procurar oportunidades de trabalho, organizar participações em concursos em que fossem requeridos grandes portfólios, agregação de equipas e promoção no mercado.

 

Essa é um pouco a ideia que o Paulo Martins Barata levantou com as “guildas de arquitectos”...

LTP: Essa questão das guildas é bastante pertinente. Mas eu acho que o modelo não é necessariamente o de serem mais próximos do Souto de Moura ou do Siza, mas é mais complexa. É uma questão de oportunidade e aí poderia de facto haver um papel institucional, com financiamento, para fazer esse trabalho de mapeamento e de “federação” de acordo com as oportunidades.

 

 

Workshop Arq 3.0 - Architecture International Challenge © Fundação de Serralves
Workshop Arq 3.0 - Architecture International Challenge © Fundação de Serralves

Será que Serralves, dando continuidade a este projecto ou gerando spin-offs, poderá colmatar esta falha de um elemento aglutinador e ajudar os arquitectos portugueses a contrariar a sua tendência mais fragmentária e a ganhar maior dimensão e competitividade?

AM: A arquitectura tem vindo a adquirir um papel fundamental na missão de Serralves ao longo dos últimos anos, e essa presença vai fortalecer-se com a entrada do novo curador de arquitectura, o arquitecto Carles Muro. No entanto será no âmbito da promoção cultural e não no da prestação de serviços de arquitectura, já que não há intenção de continuar este projecto. No entanto, alguém o deveria fazer. Seria muito útil dar continuidade a estas missões de internacionalização da arquitectura organizadas por arquitectos, já que têm uma percepção mais real e não se cingem à óptica económica com que as outras acções têm sido feitas. 

 

TN: Eu creio, no entanto, que os arquitectos portugueses, quando puseram a reflexão sobre a sua prática exclusivamente no campo da produção cultural fecharam-se sobre si mesmo. É preciso tirar a arquitectura desse pedestal restrito para uma parte da sociedade. A  arquitectura é um negócio como qualquer outro, em que se tem de criar emprego, sustentar famílias e, ao mesmo tempo, servir toda a sociedade. Existe uma visão — especialmente aqui no Norte, mas que já está em transformação com as novas gerações — de que nem se pode falar em ganhar dinheiro, senão até parece mal. Não pode persisitir esta visão antagónica entre a produção cultural e a actividade económica, que sufoca a própria profissão. Tem de se encontrar uma visão na mediania, um diálogo. E nós aceitámos fazer este projecto precisamente por ir ao encontro do que acreditamos.

 

AM: É isso também que ressalta das nossas reuniões recentes com entidades do Porto: falam sempre da dificuldade em comunicar com os arquitectos e da sua inacessibilidade. Conseguir transmitir uma nova aproximação e uma nova visão da arquitectura é também um dos objectivos deste projecto.

 

LTP: Mas, claro, mantendo o nível de qualidade...

 

Depois de todas estas acções, ficaram com uma visão diferente do exercício da profissão em Portugal face ao que encontraram no estrangeiro?

TN: Creio que todos ficámos com uma melhor perspectiva sobre a nossa prática dentro do panorama europeu e americano, uma consciência que é essencial para qualquer acção de internacionalização. 

Se, por um lado, em algumas acções, foi uma vez mais evidente quão pequenos são o nosso mercado e as nossas realizações — face a Nova Iorque, Barcelona ou França — ou nos maravilhámos com os honorários dos franceses e dos suecos, por outro lado, horrorizou-nos saber que na Suécia cada fase de projecto (estudo prévio, licenciamento, projecto de execução, etc.) vai a concurso e portanto o domínio do projecto até à obra é muito difícil. Ou perceber a distância entre o arquitecto e a obra na produção corrente em França, que envolve uma série de interlocutores de permeio. Ou seja, o El Dorado não existe e Portugal está muito longe de ser o inferno, apenas precisamos de ser mais assertivos, disponíveis, exigentes, e também humildes ao serviço dos cidadãos e da paisagem.

 

LTP: Para concluir gostaria só de referir uma questão relacionada com a comunicação do projecto: Arquitectura/3.0 não diz nada, não identifica qualquer origem. Portanto, acabámos por desenvolver o título Atlantic Design, que surgiu dos contactos com os americanos, que identificaram essa característica como nossa. Até nos propuseram o paralelo N 41º — que é o mesmo de Nova Iorque e do Porto — que curiosamente é o mesmo que tínhamos usado na Ordem para a Nova Sede da OASRN! Mas este Atlantic Design tem um potencial, finalmente local, que foi por todos reconhecido: os espanhóis também acharam bem e até no Norte da Europa. Pode consolidar-se como uma marca da arquitectura portuguesa internacional alternativa à “Escola do Porto”, ou a uma localização geográfica restrita que abraça bem todo o Norte ou mesmo todo o país.

 

E remete também para o infinito...

TN: ... e é poética. A poesia é sempre fundamental. ◊

 


 

Lista de participantes nas acções:

 

Nova Iorque — 6 Setembro 2017
AIA New York Center for Architecture

Camilo Rebelo
Carvalho Araújo
Modular System
Paula Santos
PROD
Space Workers

Barcelona — 18 Outubro 2017

Barcelona Meeting Point

 

Cannatà & Fernandes

Carlos Prata arquitectos

Figueiredo + Pena arquitectos

Garcia e Albuquerque arquitectos

Manuel Maria Reis arquitectos

MVCC arquitectos

Serôdio Furtado & associates

Estocolmo — 14 Novembro 2017

Embaixada Portuguesa

KTH Royal Institute of Technology

 

Alexandre Loureiro

André Campos.Joana Mendes arquitectos

Belém Lima arquitectos

César Machado Moreira arquitectura

Correia/Ragazzi arquitectos

José Fernando Gonçalves

Nuno Valentim arquitectura e reabilitação

Colónia — 22–24 Novembro 2017

Exponatec Cologne

 

depA Architects

Diogo Aguiar Studio

fala atelier

FAHR 021.3

OTTOTTO

Paris — 16–17 Janeiro 2018

École Spéciale d'Architecture

Consulado Geral de Portugal

 

Atelier da Bouça

AZO Sequeira Architects Associates

Brandão Costa Arquitectos

Guilherme Machado Vaz 

José Carlos Cruz arquitecto

Menos é Mais

Mima Housing

NPS Arquitectos

Nuno Graça Moura arquitecto